A decisão da Fundação ABH sobre trabalhar com Desenvolvimento Comunitário Local na periferia Sul de São Paulo não é despropositada. Nesta página, explicamos no que acreditamos: que o desenvolvimento comunitário é o esforço para melhorar as condições de vida daqueles que habitam um local específico.

E, como para atuar em uma localidade é muito importante conhecê-la a fundo, este post é para contar um pouco sobre a história da zona Sul de São Paulo. Com dados, fica mais claro porque traçar estratégias de desenvolvimento Comunitário Local na periferia sul de São Paulo faz tanto sentido para a Fundação ABH e para os moradores dos seus bairros.

 

A história da região Sul de São Paulo

Em 1960, a cidade de São Paulo era completamente diferente. A metrópole, que só na sua capital tem 12,8 milhões de habitantes, há 60 anos tinha 5 milhões: menos do que o total de veículos circulando hoje, que é de quase 7,6 milhões.

Os paulistanos nem chamavam os bairros da Zona Sul de bairros. Basta conversar com os moradores mais antigos, com idade hoje entre 70 e 80 anos. Eles sempre dizem: “temos que ir na cidade” quando se referem a ir a Santo Amaro ou ao Centro da cidade. Ou seja, “o centro” era sinônimo de cidade, e os bairros, regiões distantes, separadas pela dificuldade de acesso.

Em 1960, havia menos habitantes e carros e as casas nem garagens tinham; o metrô só seria inaugurado 14 anos depois e pouquíssimas linhas de bonde e ônibus atendiam os bairros mais distantes do centro.

Segundo dados da prefeitura de São Paulo, sozinha, a zona sul da cidade ocupa 45,5% do município, numa área de 687 km². O adensamento populacional é notório; dados da Secretaria de Planejamento Municipal (Seplan) atestam que moravam na região, em 1991, 2,9 milhões de habitantes. Menos de 15 anos depois, em 2005, o número de habitantes crescera 20% e já passava dos 3,5 milhões. Hoje, o último Censo realizado foi em 2010 e os dados por distrito mostram a quantidade de habitantes à época na casa dos 3,58 milhões; os dados projetados em 2017 mostram pouca alteração desde então (Fonte: Prefeitura de São Paulo). Esperamos ter dados mais concretos após a divulgação dos dados do Censo 2020, pois estima-se que já estamos na casa dos 3,8 milhões de habitantes.

O extremo sul de São Paulo: um pouquinho da PerifaSul

O extremo sul do Município de São Paulo é formado pelos distritos de Parelheiros, Cidade Dutra, Jardim Ângela, Marsilac, e Grajaú e ocupa uma superfície de 134 Km² dos 687 Km² de toda a zona sul, correspondendo a 8,8% do território do município de São Paulo. Ele se estende por uma vasta área abaixo dos canais dos rios Jurubatuba, Represa Billings e Represa do Guarapiranga.

Cerca de 90% de seu território está inserido em área de proteção aos mananciais, responsáveis pelo abastecimento de água de 30% da população da região metropolitana de São Paulo. Neste link, a gente mostra com detalhes, com vários infográficos como a zona Sul da cidade de São Paulo é rica e cheia de potencialidades: prato cheio para fomentar desenvolvimento comunitário local. A região sul da cidade de São Paulo é um Pulmão Verde, tem uma Zona Rural e abriga 15% das OSC da cidade!

A periferia sul de São Paulo e suas riquezas naturais

 

O crescimento populacional é um importante indicador das transformações: se em 1960, falávamos de 30.000 habitantes no total da região, e a Capela do Socorro era distante o suficiente para ser o extremo, ela passou a ter 261.230 habitantes em 1980 – e Cidade Dutra e os outros bairros ainda mais ao extremo da cidade, já estavam cada vez mais adensados. As projeções do Censo de 1.991 e na Contagem da População em 1.996, já estimam que a região contaria em 2.000 com 563.922 habitantes. Um incremento populacional de mais de 768% em 20 anos. No último censo de 2010, a população do extremo sul de São Paulo foi aferida em 594.930 habitantes, e a Densidade Demográfica (Hab/km²) era de 4.433 – que é relativamente baixo, frente à média do restante da cidade que é de 8 054,7 Hab/km², já que a extensão territorial da região sul é bem grande.

 

Políticas públicas e práticas de desenvolvimento local comunitário

A partir do ano de 1975, a ocupação da região passou a ser regulada pela Lei de Proteção dos Mananciais e pela Legislação de Zoneamento Industrial. Esta última teve algum sucesso para restringir a implantação de novas indústrias na região e também para controlar a expansão das que já existiam. No entanto, a legislação relativa aos mananciais ainda é insuficiente para conter o avanço da urbanização e a degradação ambiental. (Fonte: Anais do CODE 2011 – Artigo de Elizabeth Borelli)

Se por um lado legislar é uma forma da política pública criar caminhos para dar contorno ao desenvolvimento local; por outro, nem sempre sai como se planejou. É nessas horas que as práticas de Desenvolvimento Comunitário Local podem ser combinadas com as ações do poder público e de maneira equilibrada e integrada à comunidade, respeitando seus valores e sua riqueza histórica.

A Lei dos Mananciais estabelece baixos limites de densidade para a ocupação do solo e dificulta o licenciamento de empreendimentos na área – mesmo quando adequados às normas legais. No entanto, os terrenos da região, por causa desta Lei ficaram à margem do mercado imobiliário formal, tornaram o preço dos terrenos muito baixos. (Fonte: Prefeitura de São Paulo)

Segundo Elizabeth Borelli, a depreciação do valor da terra, somado com uma política habitacional deficitária, e também à baixa renda dos trabalhadores, à proximidade de grande concentração de empregos, a alta dificuldade de fiscalização, e de certa conivência, por parte dos órgãos públicos, causaram a rápida expansão dos loteamentos clandestinos e de favelas. Muitos deles localizados próximos a córregos que alimentam as represas. Atualmente, estima-se a existência de cerca de 200 bairros irregulares na região e 220 aglomerados habitacionais.

[gdlr_quote align=”center” ] Há exemplos concretos e de sucesso sobre a formatação de políticas públicas com a população, e não para ela, a partir de demandas locais podem ser eficazes!

Um deles é a Lei de Fomento à Periferia criada em 2015 elaborada a muitas mãos em um amplo processo de participação social! O resultado foi uma lei que fomenta a cultura, permitindo que jovens não mudem da periferia, mas mudem a periferia, gerindo recurso público para trazer impacto positivo e criar oportunidades de desenvolvimento local.

São casos como este que demonstram o quão potente pode ser desenvolver políticas públicas a partir da ótica do desenvolvimento local! – Marina Fay, Diretora Executiva da Fundação ABH[/gdlr_quote]

Uma região com uma história tão rica e com terreno tão fértil, merece apoio para as pessoas criativas e engajadas que vivem nos seus bairros possam transformar sua realidade local e construir mais parcerias em prol da comunidade. Em nenhum outro território que já visitamos em São Paulo ou outras cidades do país, vimos tamanha cooperação e sinergia entre os atores locais, refletindo na quantidade de coletivos, eventos culturais e economia solidária como na periferia sul de São Paulo.

 

A periferia sul de São Paulo é o berço de riquezas naturais

Toda a zona sul de São Paulo tem as suas riquezas e as atividades incríveis que acontecem nos seus bairros, desenvolvidas pelos seus moradores. Alguns exemplos nem são conhecidos pela maioria dos moradores do restante da cidade como a Cratera de Parelheiros e o fato de que é possível fazer ecoturismo dentro do próprio município, além do imenso pulmão verde que existe no território da zona sul.

Entre as subprefeituras de Capela do Socorro e Parelheiros existe a Área de Proteção Ambiental (APA) Bororé-Colônia. É uma área de 90 km², equivalente a 6% de todo o município – mais ou menos 57 Parques Ibirapuera. Neste espaço, há áreas remanescentes de Mata Atlântica, uma diversidade incrível de flora e muitos rios e mananciais. É nesta região onde a gente encontra a Represa Billings.

Poucos conhecem, mas há alguns projetos comunitários, desenvolvidos por moradores da região, que permitem até mesmo a realização de passeios e experiências de ecoturismo nestes espaços. Políticas Públicas que preservem a APA, como a elaboração e a manutenção do seu Plano de Manejo, são essenciais para garantir que atividades de desenvolvimento comunitário local aconteçam, gerem renda, garantam a permanência dos moradores na região e impeçam o avanço da especulação imobiliária em áreas de manancial – que são tão relevantes para toda a cidade.

É possível Velejar na Represa Billings, com o pessoal da “Meninos da Billings”; é possível passar uma temporada hospedado em um centro de turismo sustentável dentro da APA; e também é possível fazer um passeio de dia inteiro entre o Grajaú e a Ilha do Bororé – sim! São Paulo tem uma ilha que fica no meio da represa.

A Fundação ABH atua na periferia sul de São Paulo e sabe que Marsilac, Parelheiros e Grajaú são apenas três dos muitos bairros que compõem a região sul do município. Neste post reconhecemos a importância do extremo sul de São Paulo por abrigar tamanha riqueza natural. Esta riqueza que colabora na sustentabilidade ambiental de toda a cidade e apoia o desenvolvimento comunitário de toda a região sul.

Para além das atividades que mencionamos acima, a Fundação ABH reconhece e conhece atividades atividades e iniciativas que utilizam os recursos presentes na região, por exemplo coletivos e grupos de agricultura comunitária e orgânica, como a Quebrada Orgânica e a Nossa Fazenda. Sabemos que os únicos dois rios limpos da cidade ainda estão na região. Vemos muitos coletivos e outras iniciativas de desenvolvimento comunitário surgindo, assim como os inúmeros empreendimentos. Não podemos nunca perder de vista também os povos originários, e lembrar que na região sul temos aldeias indígenas que tanto lutam para seguir existindo. E acompanhamos de perto todo o potencial de descobertas e de pesquisas que a cratera de Parelheiros nos traz e ainda vai nos trazer.  Vários desses assuntos ainda serão abordados nos próximos posts do nosso blog.

Vamos mostrar como fomentar o desenvolvimento comunitário local tem relevância direta na manutenção da vida das pessoas, na ampliação da riqueza e dos acessos.

Créditos Imagem Divulgação: RicardoSAPO©