Importância da participação política na periferia

Quando falamos sobre desenvolvimento comunitário aqui no blog, citamos a participação social como um de seus pilares fundamentais.Ela é essencial para que o povo tenha controle e esteja no centro dos processos que vão resultar na evolução e crescimento do território.

A participação social pode ser classificada de dois modos: Institucional e Não-institucional. O primeiro se refere aos meios organizados pelo próprio para que a população tenha influência sobre a organização da sociedade, como, por exemplo, as eleições. Já o segundo se trata de movimentos organizados pelo próprio povo, como os famosos protestos.

Neste artigo, vamos abordar a participação social através da política, grupos políticos que atuam em prol da transformação da periferia sul de São Paulo, de que forma se movimentam, sobrevivem e as mudanças já conquistadas.

Participação política

É impossível falar de participação social sem falar de política. Isso porque ela é essencial para que a população conquiste seus direitos. O povo depende das políticas públicas e, para que elas sejam implementadas e executadas, dependem do poder público, cujos representantes são escolhidos pelo voto popular, mas quase sempre não encontram apoio onde deveriam.

Com isso, moradores do território, que vivem na pele os problemas infraestruturais e sociais na periferia se uniram para ganhar representatividade e resistir no meio político com o objetivo de promover mudanças nos lugares mais carentes e conscientizar as pessoas sobre suas necessidades, habilidades e competências para produzir, criar e gerir, bem como fazê-los compreender que podem ter influência política sobre as decisões que afetam diretamente suas próprias vidas.

Vale lembrar que a participação social e política é garantida pela Constituição Federal (CF) de 1988 e pode acontecer nas diferentes esferas de poder. No Legislativo temos o voto direto com o qual elegemos os representantes do povo; no Judiciário o júri popular é uma forma de participação social e no Executivo temos conselhos e comitês de políticas públicas populares, como associações de bairro, ou institucionais.

Movimentos políticos na periferia sul de São Paulo

Na periferia sul de São Paulo, há pouca participação social e política, seja por desconhecimento dos programas ou porque as ações são desenvolvidas por agentes externos. 

Entretanto, é histórica a ação de moradores das periferias e favelas brasileiras que se unem em busca de melhorias para a região em que vivem. As associações de bairro buscam solucionar problemas locais, como infraestrutura das vias, saneamento básico, iluminação precária, entre outros, e o grupo responsável busca trabalhar em conjunto com as autoridades locais num cenário positivo.

Além disso, existem dezenas de coletivos na região que se unem para trabalhar em benefício de causas específicas, seja educação, alimentação saudável, restauração das ruas ou fomento à cultura e ao lazer.

No entanto, os grupos encontram dificuldades quando o assunto é políticas públicas e surgem outros movimentos políticos, os chamados mandatos coletivos, que reúnem filiados de diversos partidos e ativistas de diferentes causas para lutar pelo todo.

Ainda que recentes, esses grupos vêm se destacando cada vez mais ao longo do tempo por atuarem com o objetivo de garantir os direitos do povo de existir e viver com dignidade. 

Mandatos políticos

Os mandatos políticos são movimentos inovadores nesse cenário ao trazerem diversos cidadãos com diferentes vivências para ocupar um cargo de modo a somarem experiências e forças bem como dividirem as responsabilidades nesse processo de construção e transformação do território. 

Esse nova forma de fazer política ainda não é reconhecida pela legislação brasileira, por isso, quando um grupo se candidata, um de seus membros é escolhido para representar o coletivo nas urnas e ser o responsável jurídico pelo mandato, ou seja, é o responsável por atuar em comissões, fazer os discursos nos plenários, votar, apresentar leis etc.

Na periferia sul paulista, dois deles se destacam: a Mandata Ativista (ex-Bancada Ativista) e a Mandata Quilombo Periférico.

Primeiro mandato coletivo eleito em 2018, a Mandata Ativista é composta pelas codeputadas Chirley Pankará, Claudia Visoni, Erika Hilton, Monica Seixas, Paula Aparecida e Raquel Marques que juntos promovem a discussão e o aprimoramento de leis e de políticas públicas em diversas frentes, como direitos humanos, cultura e sustentabilidade.

Dentre os Projetos de Lei (PL) propostos pelo grupo estão:

  • O PL contra a farra da privatização (PL 569/2019), que estabelece providências a serem adotadas pelo Poder Executivo para participação da população e debate qualificado da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo nas propostas de desestatização, que ainda está em tramitação.
  • O PL por e para Indígenas que busca instituir a Política Pública Estadual de Educação Básica dos Povos Indígenas (PL 503/2019), que ainda está em tramitação; o PL Mês de Agosto Indígena (PL 864/2019), que já foi aprovado e transformado na Lei nº 17.311 / 2021 e o Dia da Mulher Indígena (PL 935/2019), também ainda em tramitação.
  • PL para assistência à saúde mental Policiais (1.051/2019) que institui diretrizes para a prestação de auxílio, proteção e assistência a policiais vítimas de violência no exercício de sua função ou em razão dela, que ainda está em tramitação.
  • O PL 435/2019 transformado na Lei nº 17.137 / 2019, que garante à gestante a possibilidade de optar pelo parto cesariano, a partir da trigésima nona semana de gestação, bem como a analgesia, mesmo quando escolhido o parto normal.

Já a Mandata Quilombo Periférico é formada pelos covereadores eleitos Samara Sosthenes, Elaine Mineiro, Débora Dias, Erick Ovelha, Júlio Cezar e Alex Barcellos, lideranças do movimento negro e periférico que atuam em prol do combate ao racismo institucional, a desigualdade, bem como para incluir as minorias, gerar oportunidades e construir um presente e futuro promissor para todos. No entanto, não foi possível encontrar informações sobre Projetos de Lei e outras ações propostas ou implementadas pela Mandata.

Ambas atuam de forma horizontal, de modo que os membros dos coletivos se comunicam no mesmo nível, de igual para igual e se fortalecem na mesma medida. No entanto, a Mandata Ativista tem enfrentado crises internas devido a divergências políticas.

Em entrevista ao jornal Valor Econômico, a porta-voz do coletivo, Monica Seixas, defendeu o modelo político dos mandatórios e explicou os conflitos que o grupo tem vivido: “A diversidade por estética foi um erro. A gente tem que ser capaz de fazer síntese política […] Essa diversidade de desconhecidos na prática teve dificuldade de construir consensos para construir um único mandatório”.

Na mesma matéria, Alex Borges Barcellos, do Quilombo Periférico, falou sobre a importância dos mandatórios coletivos: “É preciso ter novos formatos de política de atuação para trazer outras pessoas […] Nós estamos muito mais próximos dos movimentos sociais do que dos partidos políticos”.

Tanto as associações, quanto às iniciativas e mandato coletivos reforçam que, apesar de divergências, que são comuns, atuar em conjunto ajuda a ampliar a diversidade ao trazer diferentes pautas para a discussão, desde a defesa dos povos indígenas à violência contra a mulher.

Como participar de um mandato coletivo?

Como dito anteriormente, apesar dos mandatos serem coletivos, apenas uma pessoa será o responsável legal e o representante do grupo no parlamento e compromissos derivados da candidatura.

Mas participar desse processo enquanto povo não é tão difícil quanto possa parecer. O político que pretende construir um mandato compartilhado pode utilizar dos meios virtuais para encontrar voluntários que representem diferentes causas e bandeiras para apoiá-lo.

Além disso, a internet é um meio amplo e rápido para ter acesso ao que o outro pensa. Através de um portal criado pelo político representante, o povo pode tanto se inscrever para atuar em conjunto com o parlamentar, quanto abrir um espaço para que a população opine e vote em propostas, trazendo assim uma pluralidade de ideias e possibilidades de chegar em um lugar comum: a transformação.

Se você pretende desenvolver um mandato coletivo, segue alguns passos importantes para estruturar uma candidatura coletiva eficaz.

  1. Estudar a composição de um gabinete  
  2. Definição do perfil da candidatura coletiva – definir todas as características, bandeiras e causas que vão compor a identidade do mandatório.
  3. Construir um mapa de atores – Fazer uma lista de nomes que podem compor a chapa é um exercício bom inclusive para entender o perfil e as possibilidades do mandatório.
  4. Convite para compor a candidatura coletiva – Este é o momento de fazer os contatos e se conectar com os possíveis nomes que vão formar a candidatura coletiva, apresentar as propostas, condições, bem como ouvir as sugestões e posições do outro.
  5. Acordos pré-campanha – São essenciais antes de levar a candidatura para rua a fim de que todas as proposições, requisitos, necessidades e metas sejam estabelecidas e o processo seja eficaz.
  6. Definição do nome na urna – Como previsto em lei, até o momento, as candidaturas são individuais, por isso apenas um membro do coletivo terá seu nome na urna e cabe ao grupo determinar de que maneira será definido o nome do representante.
  7. Desenho das pautas e propostas – São elas que motivam e que unem o grupo formado, por isso, para concluir a candidatura, é essencial determinar quais pautas, propostas, bandeiras e causas serão defendidas.